Voices



             
Provisoriamente seria chamada de  "A tenda".
Era um nome direto para uma idéia que pretendia ser tão subjetiva.
Ele estacou os pés e mesmo que quisesse fugir,eles obrigariam-no a prosseguir,mesmo que fosse evidente que seu desejo era seguir e seguir.
E se a tenda não tivesse chão e se flutuar em vez de proibido fosse necessário?
A ele restava a certeza de que todas as suas certezas íam dar em lugar algum.
Era um circo.
TRUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUM!
Mil imagens de imagens tortas passeavam no ar como uma centrifuga de sentimentos sujos
e íam cair em sua boca sedenta por mais.
Lá fora alguém mastigava sua comida requentada  e sua insatisfação condensada em urros em mesas de madeira podre.
Um padre ouvia em silêncio treinado um pecado que ele não culpava e sorria pela culpa de saber mais que a fariséia sentada a sua frente,saber o suficiente para acreditar que não há pecado.
Um suicida escrevia sua carta derradeira dizendo que não era louco como todos julgavam e que apenas queria queimar a lua com o fogo de um fósforo,para que ela tivesse luz e não precisasse tomar emprestada do sol.
Dentro da tenda,ele observava o mundo e o mundo era uma cigana fedendo a insenso e volúpia que o encarava com perversidade e pedia para que ele se aproximasse da sua mesa repleta de utensílios miraculosos.
O que ele não deixou de admirar-se ao sentar a mesa foi a falta de um objeto que ao menos ele,julgava imprescíndivel, a bola de cristal.
A cigana leu a dúvida e respondeu-lhe que boas ciganas não precisavam daquilo,oras.
Ele preferiu não estender o assunto,que ao seu ver,era incômodo.
Logo,a mulher explicou que ela preferia ler os olhos de seus clientes.
Ele pensou em dizer o quanto essa coisa de olhos era clichê e ultrapassada,mas algo no modo como ela mexia seus maxilares evidentes desencorajava tal ato.
Ele permitiu-se pensar em como tudo era significativamente inesperado, a segundos ele não sabia se iria para a casa da tia comer uma torta ainda quente e ouvir seu primo tocar orgão numa sessão angustiante de " nossa ! como ele é genial" ou " Veja! Lúcio! Deveria ter o talento do nosso Maurício".
Esse "deveria ter" o deixava em um estado emocional dilacerante que nunca chegava a abandoná-lo por completo.
Ali parado diante uma velha louca,ele sentia que, finalmente,respirava e apenas sentia,sem ter a obrigação de "ter"...

-Esse parque ao seu redor sumirá,você sabe?

A voz rouca e musical da velha cigana retirou-o de seu massacrante interlúdio.
Sumir, talvez dissolver - se em nada e fundir-se ao nada.
Aquilo parecia tão promissor e honesto e sutilmente feliz.

-Sim,eu sei.

Não cabia em si. Sentiu uma estranha ternura pela velha senhora iludida,que passaria a vida a base de "provavelmente" brincando de rir dos seus própirios vícios.
Lançou algumas moedas a mesa,deixando dois pares de olhos estupefatos.

-Não entendo mais esses garotos de 23 anos. Acham que tudo o que uma nomâde fala é lei escrita nas tábuas de Moisés!

Arrastou uns passos enquanto desfilava uns improprérios até seu quarto no fundo da tenda.

A luz de repente  parecia ser mais forte.
Como após um longo período onde estivera enfermo,parecia que só agora voltava a vida.
De fato.
A medida que tentou ensaiar alguns passos até a barraca de tiro-ao-alvo,as pessoas começaram a perder as faces e depois as roupas e depois tudo ao redor dissolveu-se em nada continuamente nada.
Restaram as vozes. E essas o acompanham até hoje.

1 comentários:

blur 11 de janeiro de 2010 às 03:58  

às vezes momentos que nem sabemos se realmente ocorreram são mais palpáveis que a soma de tudo que vivemos até agora.

Postar um comentário

ahn?

Seguidores